Juntos contra o desperdício e as perdas de alimentos

De acordo com a FAO, mais de 840 milhões de pessoas em todo o mundo ainda passam fome

Karine Salles

05/05/2015 às 15h24 - terça-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h04

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Você já parou para pensar para onde vão os restos de alimentos, seja aquele que sobra no prato ou o que é desprezado nos mercados e feiras? Ou melhor: você já parou para pensar que, como nos ensina há décadas o educador Paiva Netto, "a migalha de hoje é a farta refeição de amanhã"? Se você respondeu não para as duas perguntas, é melhor saber que, por conta de atitudes como estas, mais de "840 milhões de pessoas em todo o mundo ainda passam fome" de acordo com o dr. Alan Bojanic, representante da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) no Brasil.

E falta de comida não é desculpa: produzimos hoje mais do que suficiente para alimentar a toda humanidade. E isso não se concretiza porque até um terço de todos os alimentos são desperdiçados ou perdidos. Segundo os dados da FAO, cerca de 54% desses alimentos nem chega à mesa das pessoas: o desperdício ocorre na fase inicial da produção, manipulação pós-colheita e armazenagem. Os outros 46% que infelizmente se perdem e não matam a fome de ninguém são perdidos nas etapas de processamento, distribuição e consumo. 

Uma situação que colabora e muito para o desperdício é a estética dos alimentos. Uma caixa de tomates, por exemplo, que está boa para o consumo, mas que não tem a 'aparência bonita' deixa de ser comprada e no final é descartada pelos comerciantes. De acordo com o dr. Alan, a quantidade desperdiçada é um "absurdo", pois é "comida que poderia ser dada para muitas pessoas carentes".

Além disso, segundo o especialista, a comida que é jogada fora tem impacto na economia e contribui também para aumentar as emissões de gases-estufa e diminuir as reservas de água potável e a biodiversidade no Planeta. Aqui no Brasil, por exemplo, o desperdício de alimentos chega a 40 mil toneladas por dia, segundo pesquisa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). 

E O QUE PODE SER FEITO?

As ações para evitar que toneladas e toneladas de comida acabem no lixo depende de cada um de nós. Afinal de contas, há perdas no campo, no transporte, no armazenamento e no processo culinário. Aqui no Brasil, a organização não governamental Banco de Alimentos tem como objetivo minimizar os efeitos da fome e combater o desperdício de alimentos, permitindo que um maior número de pessoas tenha acesso a alimentos básicos e de qualidade, e em quantidade suficiente, para uma alimentação saudável e equilibrada.

Para a fundadora da ONG, Luciana Quinaglia Quintão, "é um absurdo muito grande ter pessoas passando tanta fome, com tanta dificuldade para existir, quando jogamos fora milhões de quilos de alimentos todos os dias, invés de fazer com que ele chegue a quem precisa". Os alimentos distribuídos pela organização são excedentes do comércio, perfeitos para o consumo. Além disso, há ações de educação com as instituição beneficiadas. "Ensinamos como ter o aproveitamento integral dos alimentos: como usar os talos, as cascas e as sementes. Isso é importante para quem tem o que comer e para quem não tem", explicou Luciana Quinaglia Quintão.

"Os bancos de alimentos são parte da resposta, mas também temos que ter uma maior consciência nos momentos de comprar os alimentos, para não comprar o que não vamos precisar". Outra situação apontada pelo representante da FAO foi que "muitas pessoas botam muita comida no prato e só comem um pouquinho. O resto vai pro lixo". 

Em seu recente artigo Crime do desperdício, o diretor-presidente da Legião da Boa Vontade (LBV) José de Paiva Netto alerta: "Urge impedir o desperdício. É providência sensata, humanitária, em todas as áreas e das mais diferentes classes sociais. É um crime, por exemplo, deixar estragar alimentos, quando milhões de pessoas ainda passam fome".

DONAS DE CASA DÃO O EXEMPLO

As sobras de alimentos consumidos no dia a dia não precisam, necessariamente, ser jogadas no lixo. Elas podem ser reaproveitadas em receitas saborosas e saudáveis. Essa é uma atitude simples que ajuda a combater o desperdício. Para a nutricionista Lilian Gullo criar esse hábito, além de nutritivo, auxilia na qualidade de vida. “Preparar esses alimentos da melhor forma possível inclui aproveitar cascas, talos e sementes”. 

“Quando há sobra de arroz dá para fazer bolinho; o pão eu guardo de um dia para o outro, coloco na geladeira e no dia seguinte eu esquento e fica fresco; sobra de carne dá pra fazer muitas outras coisas, então, não há motivos para estragarmos os alimentos”, afirmou a dona de casa Lêda Almeida. Já a sra. Jussipara Trindade destacou que tem "o costume de fazer economia de alimentos porque sabemos que a população brasileira está passando dificuldades na mesa. A verdura que sobra, fazemos uma sopa. E dessa forma eu mostro aos meus filhos que lá fora a dificuldade é grande. A situação está cada vez mais difícil para milhares de pessoas, por isso temos que nos reeducar, para que amanhã não tenhamos dificuldades". 

Vivian R. Ferreira
No atendimento às crianças em situação de risco social, a LBV se preocupa em oferecer uma alimentação saudável, rica em verduras, legumes e frutas, cumprindo o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA).

ATENDIDOS PELA LBV APRENDEM O VALOR DO ALIMENTO DESDE CEDO

A alimentação saudável também é uma preocupação da Legião da Boa Vontade (LBV) em suas Escolas, Centros Comunitários e Lares para Idosos, no atendimento às famílias em situação de risco social. Durante o período em que estão na Instituição, os atendidos recebem refeições que contam com um cardápio balanceado, de acordo com a faixa etária de cada um e recebendo o apoio de nutricionista. 

Outra ação desenvolvida, sobretudo com as crianças, é a conscientização para que não haja desperdício de alimentos. "No momento da refeição, as educadoras fazem intervenções para que elas percebam o quanto aquele alimento é fundamental, não apenas para o seu desenvolvimento, mas que aquele alimento, que poderia ir para o lixo, poderia também alimentar uma pessoa que não tem", ponderou a pedagoga Aline Trevisan, assistente de direção do Conjunto Educacional Boa Vontade. A conscientização dos pequenos é um passo importante para que os adultos do amanhã saibam como cuidar dos recursos e transmitam essa consciência às próximas gerações. Esse cuidado, aliás, pode começar agora, né? =)