H3N2: a principal estratégia de combate é a prevenção

Especialistas da FIOCRUZ esclarecem dúvidas sobre o tipo de vírus em circulação e as formas de prevenção.

Da redação

23/12/2021 às 10h03 - quinta-feira | Atualizado em 23/12/2021 às 16h48

O número e gravidade dos casos confirmados de influenza, provocada pelo vírus H3N2, tem gerado grande preocupação no Brasil nas últimas semanas. Conhecida comumente como gripe, a Influenza A (H3N2) provocou cinco mortes no estado do Rio de Janeiro neste ano. Em 2020 foi apenas uma morte e, em 2019, duas. 

A capital fluminense, por exemplo, tem vivido, nos últimos dias, uma epidemia de gripe, com mais de 20 mil casos deste subtipo de influenza nas últimas semanas. Por isso, a prefeitura intensificou a campanha de vacinação no município e abriu centros de tratamento específicos para o tratamento da doença.

Em entrevista para o Portal Fiocruz, o virologista Fernando Motta, pesquisador do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), explicou detalhes sobre a disseminação do vírus Infleunza A (H3N2) em nosso território. Também em entrevista, o infectologista e pesquisador do Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz), José Cerbino Neto, apresentou as medidas que devemos adotar para evitar a contaminação pelo vírus e entender porque é fundamental se vacinar contra a doença.

O que é o vírus H3N2 e quais os sintomas da gripe que ele provoca?
Fernando Motta (IOC/Fiocruz): O vírus H3N2 é um dos subtipos do vírus influenza A, por isso chamamos de influenza A (H3N2). Os sintomas provocados por este vírus são os clássicos da clínica de gripe: febre alta com início agudo, cefaleia, dores articulares, constipação nasal e inflamação de garganta e tosse. Em alguns casos pode haver vômito e diarreia, sendo estas manifestações pouco frequentes e mais comuns em crianças.

Quais são as cepas de Influenza mais associadas aos casos de "gripe comum" no Brasil? O H3N2 é uma delas?
Fernando Motta: Todos os anos, as epidemias de influenza são provocadas por variantes de três vírus principais, dois do tipo A: influenza A(H1N1)pdm09 e A(H3N2), e o influenza B, que não tem subtipos. Estes são os vírus que circulam na população humana, podendo haver maior circulação de um ou de outro. O vírus H3N2 tem circulado de modo preponderante desde 2015 no Brasil e no mundo. Por ser um vírus que há décadas adaptado à população humana, ele apresenta um perfil clássico de acometimento de pessoas nos extremos de faixa etária, crianças e idosos, que podem apresentar complicações com necessidade de internação.

Apesar de conhecido, a cada ano pequenas mutações podem gerar alterações nos vírus e dar origem a cepas com diferentes comportamentos. Cada epidemia deve ser acompanhada nas diferentes regiões do país. 

O vírus H3N2 poderia causar uma pandemia como a do Infleunza A (H1N1) em 2009?
Fernando Motta: O vírus H3N2 foi introduzido há décadas na população humana por um processo similar ao que ocorreu em 2009, em um evento de abrangência global – em uma pandemia. A transmissão dos dois é a mesma e o H3N2 só provocaria uma nova pandemia se ocorresse a recombinação de material genético oriundo de uma variante de influenza não humano (por exemplo, se ocorresse um rearranjo genético com amostras de influenza suínas ou aviárias).

A vacina contra a gripe oferecida pelo SUS no Brasil imuniza contra os vírus de gripe mais comuns em circulação? O Infleunza H3N2 está entre eles?
Fernando Motta: Sim. A vacina oferecida no Sistema Único de Saúde (SUS) prevê cepas dos subtipos A (H1N1, A(H3N2) e B, ajustadas para serem as mais próximas possíveis dos vírus circulantes na população. Por isso, é importante a vacinação a cada nova campanha, para sempre se estar imunizado com o vírus mais próximo possível daqueles circulantes no país.

Quem tomou a vacina no ano passado ou nos anos anteriores deve se vacinar novamente contra a gripe?
Fernando Motta: Sim. As vacinas são atualizadas para cada epidemia, e mesmo que apenas um componente seja alterado é importante a renovar a vacinação. Outro aspecto desejado com a nova vacinação é o efeito de 'boost' provocado pela nova vacina, reforçando as defesas ativadas no ano anterior.

Qual é o tratamento indicado para a gripe do H3N2?
Fernando Motta: O subtipo H3 segue a mesma recomendação preconizada para todos os influenza sazonais humanos. Acompanhamento de suporte pra casos sem complicação e sendo necessário, internação e uso de medicamento antiviral específico.

Como é o tratamento de uma pessoa com Influenza. Ela deve ser isolada?
José Cerbino Neto:
É importante destacar que além da vacina nós temos o antiviral, que é um medicamento específico para o tratamento das pessoas gripadas. Esse antiviral tem que ser iniciado rapidamente para que ele surta efeito. O ideal é que seja iniciado nas primeiras 48 horas dos sintomas e, no máximo, até quatro dias de doença para que ele tenha realmente alguma eficácia.

No momento que você tem o sintoma respiratório deve procurar a assistência médica para que o diagnóstico seja rápido, principalmente se você tem alguns fatores de risco para as formas graves, se é idoso, uma criança muito nova, se tem alguma outra comorbidade ou doença.

A gripe começa a ser transmitida antes dos sintomas. Então, do ponto de vista de convívio social, não há uma restrição de você ter que ficar isolado em casa. Mas uma coisa importante, e essa é uma mudança cultural que precisamos reforçar, é que a criança doente não pode ir para a escola e que a pessoa gripada não pode trabalhar porque isso é o que amplia a disseminação da doença. Em um ambiente de trabalho ou na escola, a taxa de aglomeração é muito maior do que em casa. Em casa você convive com mais uma, duas ou três pessoas e no trabalho, 200 pessoas.

Existe algum grupo mais afetados pela Influenza?
José Cerbino Neto: O risco de infecção é igual para todo mundo, mas existem grupos que possuem o risco da forma mais grave da Influenza, como os idosos, as crianças até cinco anos, as gestantes e as pessoas com outras doenças, principalmente doenças pulmonares ou cardiovasculares.

Podemos dizer que a vacina não imuniza contra o vírus da Influenza, mas que ela minimiza os sintomas caso a pessoa venha a ficar doente?
José Cerbino Neto: Não, a vacina imuniza sim contra o vírus, mas nenhuma vacina é 100% eficaz. Em alguns casos ela não impede totalmente que você se infecte pelo vírus, mas ela reduz muito o risco, principalmente de formas graves.

Quais as medidas preventivas que podemos adotar para evitar a transmissão da doença?
José Cerbino Neto: As duas principais medidas são as lavagens das mãos e evitar o contato com as mucosas. Existem até campanhas que falam dos sete buracos da cabeça (olhos, ouvidos, narinas e boca) e se você evitar o contato com eles, não terá transmissão da Influenza por essa via, principalmente em regiões tropicais como a nossa. Existem trabalhos que mostram que aqui a transmissão pelo contato é até mais importante que a transmissão aérea.

“Ah, mas a transmissão não é respiratória?”, a pessoa pode perguntar. Ela ocorre por gotículas respiratórias, mas não é necessariamente aérea. Por exemplo, o computador é um clássico para transmissão de gripe. Você está ali trabalhando, tosse, espirra ou fala em cima do teclado, outra pessoa vem, usa aquele teclado e como o vírus sobrevive algum tempo no ambiente, pode se infectar.
Como expliquei, em regiões tropicais isso pode ser até mais importante do que em locais mais frios. O vírus sobrevive um tempo no ambiente, mas isso varia de acordo com a umidade, a temperatura do local. etc.

Então, lavagem das mãos é importante, o uso de álcool gel também. Esse tipo de higiene é fundamental, além de se manter os ambientes sempre bem arejados. 

A gente pode reforçar que a vacina está melhor adaptada ao vírus H3N2, mas como é uma situação dinâmica não temos como prever, teoricamente, qual vai ser a efetividade dela.

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Fonte: Portal FIOCRUZ