Comunidades devem liderar para acabar com a Aids

Karine Salles

01/12/2023 às 06h35 - sexta-feira | Atualizado em 01/12/2023 às 09h58

Neste 1º de dezembro é celebrado o Dia Mundial de Luta contra a Aids. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), a fim de criar um dia para lembrar a batalha constante contra a enfermidade, visando mobilizar a opinião pública sobre a gravidade da doença, e de amenizar o preconceito sofrido pelos portadores do HIV, o vírus causador. A data também celebra os progressos alcançados na resposta global ao HIV.

“Comunidades Liderando”

Em seu novo relatório, chamado “Comunidades Liderando“, o UNAIDS chama a atenção para o papel crucial desempenhado pelas comunidades na resposta ao HIV e como a falta de financiamento e a existência de barreiras prejudiciais estão impedindo seu trabalho salvador de vidas e, com isso, criando obstáculos para acabar com a AIDS como ameaça à saúde pública até 2030.

“As comunidades em todo o mundo mostraram que estão prontas, dispostas e capazes de liderar o caminho para acabar com a AIDS como ameaça à saúde pública. Mas é necessário que as barreiras que obstruem seu trabalho sejam derrubadas que elas sejam devidamente financiadas”, disse Winnie Byanyima, diretora executiva da Unaids. “Com frequência, as comunidades são tratadas por quem tem poder de decisão como problemas a serem gerenciados, em vez de serem reconhecidas e apoiadas no seu papel de liderança. As comunidades não são um entrave: elas iluminam o caminho para o fim da AIDS.”

O assessor sênior da Unaids, Cleiton Euzebio de Lima, disse que o relatório representa ao mesmo tempo “uma celebração” do papel fundamental que as organizações e redes de pessoas vivendo com HIV/Aids desempenham e um chamado para que governos e doadores incrementem o apoio. 

Exemplos inspiradores de Brasil e Moçambique

Apesar dos desafios, o especialista destaca o que considera “exemplos inspiradores da atuação incansável de ativistas e líderes comunitários”.

“Em Moçambique, a Kuyakana, uma rede nacional de mulheres com HIV tem atuado para empoderar mulheres e meninas e aumentar a conscientização sobre a prevenção do HIV. Elas também atuam junto a unidades de saúde em todo o país, identificando barreiras de acesso ao tratamento e apoiando a adesão das mulheres vivendo com HIV. No Brasil, por exemplo, o movimento de pessoas trans foi fundamental para a conquista de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que garante o direito das pessoas trans de mudarem oficialmente nos documentos seu nome e gênero sem a necessidade de uma ordem judicial.”

Uma morte por minuto

A cada minuto, uma pessoa morre de Aids. Todas as semanas, 4 mil meninas e mulheres jovens são infectadas com o HIV e, das 39 milhões de pessoas que vivem com o vírus, 9,2 milhões não têm acesso a tratamento.

A diretora executiva do Unaids, Winnie Byanyima, afirmou que "muitas vezes, as comunidades são tratadas pelos tomadores de decisão como problemas a serem gerenciados, em vez de serem reconhecidas e apoiadas como líderes”.

A OMS afirma que os grupos da sociedade civil têm moldado a resposta ao HIV/Aids por décadas. As contribuições incluem a luta contra o estigma e a discriminação, a defesa do acesso a tratamentos por preços baixos e a criação de serviços liderados pela comunidade, que colocam as pessoas afetadas no centro das decisões e intervenções. 

"AIDS — O VÍRUS DO PRECONCEITO AGRIDE MAIS QUE A DOENÇA"

Apesar de o Brasil ter um dos melhores tratamentos contra HIV/Aids em todo o mundo — reconhecido e recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) —, a exclusão social sofrida pelos portadores do vírus ainda é um grande obstáculo.

Embora os testes e o tratamento estejam disponíveis, muita gente continua sem acesso a eles por causa do estigma e do preconceito. "Ninguém está preparado para receber uma notícia dessa", afirmou Lúcia* ao Portal Boa Vontade. Aos 28 anos, quando descobriu ser soropositiva, "a sensação que passou na cabeça é que iria morrer". Muitos se sentem solitários e isolados, e este é um momento em que o apoio da família e amigos e todo tipo de auxílio de especialistas são indispensáveis.

Em seu artigo Aids e Direitos Humanos, Paiva Netto afirma: "Se a pessoa se sentir humanamente amparada, criará uma espécie de resistência interior muito forte, que a auxiliará na recuperação ou na paciência diante da dor. Costumo afirmar que o vírus do preconceito agride mais que a doença". Vale ressaltar que quem vive com o vírus pode trabalhar, estudar, namorar, constituir família, fazer exercícios físicos, assim como todo mundo. Só não pode conviver com o preconceito, que muitas vezes faz a pessoa abandonar o tratamento médico.

O surgimento da doença despertou medo e intensificou dúvidas, o que fez muita gente ocultar a doença por medo de discriminação por parte da família e das pessoas próximas. Quem vive com o vírus pode trabalhar, estudar, namorar, constituir família, fazer exercícios físicos, assim como todo mundo. Só não pode conviver com o preconceito, que muitas vezes faz a pessoa abandonar o tratamento médico.

"Tive muito preconceito da família e dos amigos. É aí que a gente vê realmente quem é que está do nosso lado". Mesmo com toda a informação disponibilizada pela mídia, ainda se cria muito medo em relação ao portador do HIV/Aids, como se a doença fosse transmitida através do toque, do ato de cumprimentar, abraçar. "É muito dolorido pra gente. Tive depressão", afirmou Lúcia.

O AMOR SUPERA A DOENÇA

Em seu livro Reflexões da Alma, o escritor Paiva Netto afirma: "O organismo humano é a mais extraordinária máquina do mundo. Mesmo assim, falha. Contudo, com Amor até os remédios passam a ter melhor resultado".

Foi inspirada por Jesus, o Médico Celeste, e no amor que Lúcia sente pelos seus filhos, que ela reuniu forças para voltar a viver: "Eu precisaria estar bem para poder tomar conta deles. Eles precisavam de mim". Ela relata que foi com essa força que buscou e adquiriu conhecimento e orientação em grupos de apoio em sua cidade. Com isso, ela pôde explicar aos seus familiares e amigos como é o tratamento da pessoa portadora do HIV.

O que as campanhas lembram à sociedade é que os portadores do HIV são pessoas normais e não devem nunca ser estigmatizadas. Ao coração das pessoas que sofrem qualquer tipo de preconceito, Lúcia deixou uma mensagem de conforto e motivação: "Não desistam, pois a vida é muito bela! A gente pode amar e se amar, apesar de sermos soropositivos". Lúcia recomenda, também, buscar forças no Pai Celestial, da mesma forma que ela fez.

APOIO DA LBV

Arquivo BV

Em 1º de dezembro de 1996, no Dia Internacional da Luta contra a aids, personalidades se uniram à multidão que superlotou a Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, RJ, para a mobilização da LBV em defesa da Vida.

Em 1º de dezembro de 1996, no Dia Internacional da Luta contra a Aids, personalidades se uniram à multidão que superlotou a Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, RJ, para a mobilização da LBV em defesa da Vida.

Muitas conquistas têm sido alcançadas em parte por iniciativa da sociedade civil organizada. Em 1º de dezembro de 1996, por exemplo, no Dia Internacional da Luta contra a Aids, a Legião da Boa Vontade, em sua permanente campanha a favor da Vida e contra o preconceito, reuniu mais de 200 mil pessoas na orla marítima, na Praia de Copacabana, Rio de Janeiro, RJ. A iniciativa teve o apoio de dezenas de personalidades que, com a multidão, bradaram esta máxima de Paiva Netto: "Aids – o vírus do preconceito agride mais que a doença"


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Com informações do Unaids e Nações Unidas
* A identidade da entrevistada foi mantida em sigilo para preservar sua imagem.