Beth Carvalho, uma cantora interplanetária

A Rainha do Samba, que completou 70 anos de vida, tem no repertório música tocada até em Marte.

Hilton Abi-Rihan

06/05/2016 às 10h40 - sexta-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h05

O ano de 2016 é particularmente significativo para aconsagrada cantora e compositora carioca Beth Carvalho, cujo nome de batismo é Elizabeth Santos Leal de Carvalho. Isso porque, além  de completar, nessa quarta-feira, 5 de maio, 70 anos de vida, ela segue celebrando o meio século de carreira, completado em 2015. Essa dupla comemoração é marcada por uma discografia de 34 discos e 5 DVDs, que inclui o mais recente trabalho da artista, Beth Carvalho ao Vivo no Parque Madureira, lançado há dois anos.

Priscilla Antunes
Beth Carvalho, a Rainha do Samba, completou, neste mês, 70 anos de vida.


Com uma extensa lista de distinções e prêmios recebidos no Brasil e no exterior, Beth também teve a voz levada para fora do planeta Terra. O fato inusitado ocorreu em 1997, quando a música Coisinha do Pai — composta pelos sambistas Jorge Aragão, Almir Guineto e Luiz Carlos e um dos grandes sucessos do repertório dela — foi programada por Jacqueline Lyra, engenheira brasileira da Nasa, para acionar o jipe-robô Sojourner, que a agência espacial norte-americana havia mandado para a superfície de Marte. “Fiquei sabendo que ela [Jacqueline] era mangueirense, porque falei com ela ao telefone. Pensei: ‘Vou ligar para agradecer a homenagem’. É demais, né?”, disse a artista, em entrevista bem descontraída ao programa Samba & História, da Boa Vontade TV. Ainda brincou: “A partir daí, virei cantora interplanetária!”.

O contato de Beth Carvalho com a música foi incentivado pela família desde a infância. Aos 8 anos, ela ouvia, emocionada, as canções de Sílvio Caldas, Elizeth CardosoAracy de Almeida, grandes amigos de seu pai, João Francisco Leal de Carvalho, que a levava com regularidade aos ensaios das escolas de samba e às rodas de samba. A mãe, Maria Nair Santos Leal de Carvalho, tocava piano clássico, e a avó paterna, Maria da Ressurreição Leal — mais conhecida como dona Ressu —, foi professora de música em Teresina/PI e tocava bandolim e violão. Tudo isso despertou a veia artística da jovem Beth, que teve forte influência também da bossa nova.

Priscilla Antunes
Beth Carvalho e  Abi-Rihan, radialista, jornalista e apresentador do programa Samba & História, da Super Rede Boa Vontade de Comunicação (rádio e TV).

Berço igualmente importante para a cantora foi o tradicional bloco carnavalesco Grêmio Recreativo Cacique de Ramos, no qual encontra amigos antigos e faz novos. “É o meu quintal. Todo mundo, tudo que era compositor, que não tinha espaço, passou a ir para lá, sabia que eu estava lá”, contou.

Durante o bate-papo, ela aproveitou para expressar toda a sua afeição por outro reduto da música que teve grande relevância em sua formação pessoal e profissional: a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, de que sempre se recorda com carinho. “É eterna a Mangueira, minha escola até eu morrer, escola que escolhi quando era criança. Eu ia para a avenida, e minha mãe alugava caixote para eu ficar mais alta.”

Sob todas essas referências culturais, Beth moldou sua bem-sucedida carreira. Com voz agradável e interpretações memoráveis, imortalizou clássicos do samba de diversas épocas, entre os quais Andança (de Danilo Caymmi, Edmundo SoutoPaulinho Tapajós) — título de seu primeiro LP, lançado em 1969 —, Folhas Secas (de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito), O Mundo É um Moinho e As Rosas não Falam (ambas de Cartola).

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Ao fim da entrevista, a “Rainha do Samba” e “Madrinha do Pagode”, como Beth também é chamada, recebeu uma camiseta da Legião da Boa Vontade.

Uma prova de que, independentemente do idioma, o bom samba alegra e empolga nações é que Beth Carvalho já se apresentou em vários palcos do exterior, com destaque para o Carnegie Hall, em Nova York, nos Estados Unidos. Exibiu-se ainda em outras importantes cidades do continente americano, bem como na Europa e na África.

Isso tudo possibilitou que a cantora alçasse projeção internacional, sendo, até mesmo, objeto de estudo do outro lado do mundo. A Faculdade de Música de Kyoto, no Japão, tem a carreira musical dela incluída no currículo escolar. “Agora se quero saber da minha vida pergunto para os japoneses, porque eles sabem mais de mim do que eu”, fez graça.

O dom de Beth de resgatar e revelar inúmeros músicos e compositores é sempre lembrado. Entre seus muitos afilhados estão Zeca Pagodinho, o grupo Fundo de Quintal, Arlindo Cruz e Jorge Aragão. “Eles são maravilhosos, talentosos, e eu tenho orgulho de ser madrinha deles!”, comentou.

Outro momento em que a carreira de Beth evidenciou a importância da união e amizade por meio da música se deu quando ela foi homenageada pela Velha Guarda da Escola de Samba Portela. Foi um reconhecimento pelo fato de ela ser a cantora que mais gravou canções dos compositores da tradicional agremiação de Madureira. Mangueirense de coração, a intérprete disse que a rivalidade entre as escolas de samba se restringe à avenida. “Entre nós não tem isso, não; só na hora do desfile.”

A entrevista de Beth Carvalho ao programa Samba & História, da Boa Vontade TV (canal 196 da NET e da Claro TV e 212 da Oi TV) será veiculada neste domingo, às 14 horas. Não perca!