Linguagem de web, "internetês" entra na sala de aula e preocupa professores

Nathan Rodrigues

16/05/2016 às 09h00 - segunda-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h02

O "internetês" é uma maneira rápida de se comunicar na web, mas o "dialeto" ultrapassou as fronteiras digitais e tem prejudicado o desempenho escolar de crianças e adolescentes.

As percepções do mundo se alteram conforme a tecnologia evolui. E essas mudanças também afetam a maneira como nos comunicamos. No ambiente virtual, por exemplo, quanto mais simples, melhor! Essa é a premissa do “internetês”, que tem permeado a comunicação na web, principalmente entre jovens.

O “idioma digital” é caracterizado pelo uso de palavras abreviadas, a dispensa de sinais gráficos e a utilização de desenhos ou animações que expressam sentimentos — os chamados gifs. Uma afronta à norma padrão do Português? Nem tanto. É a língua que se molda para a grande rede, ambiente que exige agilidade na troca de informações.

"Nossa sociedade é formada por grupos que se organizam por afinidades. Para melhor se comunicarem, criam os jargões, que são variações do vocabulário especificamente destinadas à expressão de alguma especialidade. Eles aproximam pessoas com interesses comuns e agilizam a comunicação entre os membros de um mesmo grupo", explica Rosana Morais Weg, doutora em Português pela Universidade de São Paulo.

Mas o “internetês” ultrapassou o universo digital, preocupando professores e autoridades da área. O uso desmedido da linguagem tem prejudicado o rendimento escolar dos estudantes“Esses neologismos escapam do vocabulário da língua oficial padrão, não sendo, portanto, adequados em situações formais. O jargão, quando exagerado, é alvo de crítica e é considerado um vício de linguagem. Recebe até um sufixo próprio, o ‘ês’, como em juridiquês, internetês, etc”, completa a professora, autora de diversos livros, dentre eles, A língua como expressão e criação.

E os problemas podem ir além da sala de aula. Ao migrar da web para outros campos, o “internetês” deixa de ser um facilitador para a comunicação, podendo, inclusive, atrapalhar o desempenho profissional.  “O importante é que a família e a escola orientem os jovens a fazerem uso produtivo da internet, oferecendo a eles a oportunidade de lerem textos de boa qualidade”, completa Rosana.

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O uso excessivo do "internetês", verificado em textos na grande rede e em mensagens de celular, podem trazer diversos prejuízos, atrapalhando, inclusive, o desempenho profissional.

Assim, a leitura mostra aos adolescentes que a linguagem simplificada da internet é benéfica para textos digitais, mas o norma padrão jamais deve ser ignorado. "A família deve sempre promover o hábito da leitura entre as crianças e jovens. E até entre os parentes mais velhos, independentemente de eles usarem a internet ou não", aponta a professora. 

PARA EVITAR PREJUÍZOS FUTUROS

A professora Lenice Santana, da Escola Estadual Marechal Deodoro, levou um susto ao corrigir as atividades de casa de seus alunos. As respostas estariam corretas se não estivessem recheadas de "vc", "axo", "naum" e "tbm" e abusassem do gerúndio e das gírias. Ao confrontá-los, descobriu que as palavras esquisitas eram comuns na internet. "Eles têm 10 anos e costumam usá-las com mais frequência que as formas corretas. Com isso, a linguagem se torna bem pobre", reitera.

E para mostrar que essa linguagem não é adequada para a sala de aula, a educadora passou a trabalhar com seus alunos diversos jogos didáticos e iniciativas em grupo, além de promover a leitura de textos. "Eu desenvolvo muitas atividades que mostram que é preciso seguir sempre a norma padrão do Português, mesmo que você use essas gírias e abreviações na internet. Elas não estão erradas, desde que fiquem nas mensagens eletrônicas e blogs e o aluno saiba a maneira correta de escrever essas palavras".

As medidas têm surtido efeito. Ela afirma que os estudantes ficaram mais vigilantes com suas escritas. "É interessante porque eles mesmos identificam erros e se corrigem, dizem: 'olha, isso aqui não está certo, é assim que se escreve'".

Lenice garante que as recomendações dadas em sala de aula também são ditas em sua própria casa, para o filho Ramon, de 15 anos. E o adolescente, que possui contas em redes sociais e navega com frequência pela grande rede, confirma que a mãe acompanha de perto todos os seus textos. 

"Nós utilizamos essa linguagem para poupar tempo. Além de existirem palavras grandes, você precisa se comunicar com rapidez. Mas essa maneira não combina com a sala de aula", ressalta o jovem.