Preconceito ainda é maior obstáculo para o combate à Aids

Além da falta de informação entre jovens, a diretora do Unaids relembra que a discriminação faz com que as pessoas demorem para fazer testes e procurar tratamento precocemente.

Karine Salles

01/12/2017 às 01h55 - sexta-feira | Atualizado em 01/12/2017 às 08h47

Shutterstock

Apesar de o Brasil ter um dos melhores tratamentos contra HIV/Aids em todo o mundo — reconhecido e recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) —, a exclusão social e o preconceito sofridos pelos portadores do vírus ainda são um grande obstáculo.

Vivian R. Ferreira
Dra. Georgiana Braga-Orillard.

De acordo com a diretora Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS no Brasil, dra. Georgiana Braga-Orillard, a Aids no Brasil tem dois lados: “Nós temos a resposta brasileira, que por um lado é bastante desenvolvida. E o outro lado o que a gente ainda tem que trabalhar muito é a discriminação tanto das pessoas vivendo com o HIV quanto das populações mais vulneráveis à epidemia”, afirmou em entrevista à Super Rede Boa Vontade de Comunicação (Rádio, TV, Internet e Publicações).

Além disso, embora os testes e o tratamento estejam disponíveis, muita gente continua sem acesso a eles por causa do estigma e do preconceito. "Ninguém está preparado para receber uma notícia dessa", afirmou Lúcia* ao Portal Boa Vontade. Aos 28 anos, quando descobriu ser soropositiva, "a sensação que passou na cabeça é que iria morrer". Muitos se sentem solitários e isolados, e este é um momento em que o apoio da família e amigos e todo tipo de auxílio de especialistas são indispensáveis.

Em seu artigo Aids e Direitos Humanos, o jornalista e escritor Paiva Netto afirma: "Se a pessoa se sentir humanamente amparada, criará uma espécie de resistência interior muito forte, que a auxiliará na recuperação ou na paciência diante da dor. Costumo afirmar que o vírus do preconceito agride mais que a doença". 

O surgimento da doença despertou medo e intensificou dúvidas, o que fez muita gente ocultar a doença por medo de discriminação por parte da família e das pessoas próximas. Quem vive com o vírus pode trabalhar, estudar, namorar, constituir família, fazer exercícios físicos, assim como todo mundo. Só não pode conviver com o preconceito, que muitas vezes faz a pessoa abandonar o tratamento médico.

Shutterstock

"Tive muito preconceito da família e dos amigos. É aí que a gente vê realmente quem é que está do nosso lado". Mesmo com toda a informação disponibilizada pela mídia, ainda se cria muito medo em relação ao portador do HIV/Aids, como se a doença fosse transmitida através do toque, do ato de cumprimentar, abraçar. "É muito dolorido pra gente. Tive depressão", afirmou Lúcia.

O que as campanhas lembram à sociedade é que os portadores do HIV são pessoas normais e não devem nunca ser estigmatizadas. “Precisamos, ainda, trabalhar bastante a discriminação, pois ela faz com que as pessoas ainda não se previnam, não se testem e não se tratem", enalteceu dra. Georgiana Braga-Orillard.

O AMOR SUPERA A DOENÇA

Em seu livro Reflexões da Alma, o escritor Paiva Netto afirma: "O organismo humano é a mais extraordinária máquina do mundo. Mesmo assim, falha. Contudo, com Amor até os remédios passam a ter melhor resultado".

Foi inspirada por Jesus, o Médico Celeste, e no amor que Lúcia sente pelos seus filhos, que ela reuniu forças para voltar a viver: "Eu precisaria estar bem para poder tomar conta deles. Eles precisavam de mim". Ela relata que foi com essa força que buscou e adquiriu conhecimento e orientação em grupos de apoio em sua cidade. Com isso, ela pôde explicar aos seus familiares e amigos como é o tratamento da pessoa portadora do HIV.

Ao coração das pessoas que sofrem qualquer tipo de preconceito, Lúcia deixou uma mensagem de conforto e motivação: "Não desistam, pois a vida é muito bela! A gente pode amar e se amar, apesar de sermos soropositivos". Lúcia recomenda, também, buscar forças no Pai Celestial, da mesma forma que ela fez.

AINDA É PRECISO AVANÇAR

A realidade da aids na vida brasileira e mundial têm dados alarmantes, porém com bons resultados a serem reconhecidos. Um deles é que o objetivo de alcançar 15 milhões de pessoas em tratamento para o HIV foi alcançado 9 meses antes do prazo. E o número de novas infecções diminuíram 35,5%. No mundo, o número de pessoas vivendo com HIV em 2014 era de 36,9 milhões de pessoas, segundo o Unaids.

“Pela primeira vez na história de metas, nós conseguimos parar e reverter o ciclo da epidemia de aids e conseguimos colocar 15 milhões de pessoas em tratamento. Agora, isso nos dá uma esperança muito grande de continuar a colocar mais pessoas em tratamento e prevenindo que mais pessoas sejam infectadas”, finalizou a dra. Georgiana Braga-Orillard, representante do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids no Brasil

Além da falta de informação entre jovens, a diretora do Unaids relembra que a discriminação faz com que as pessoas demorem para fazer testes e procurar tratamento precocemente. Muitas pessoas morrem sem sequer saber que têm a doença, pelo medo de perder a família, os amigos, o emprego.

APOIO DA LBV

Arquivo BV

Em 1º de dezembro de 1996, no Dia Internacional da Luta contra a aids, personalidades se uniram à multidão que superlotou a Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, RJ, para a mobilização da LBV em defesa da Vida.

Muitas conquistas têm sido alcançadas em parte por iniciativa da sociedade civil organizada. Em 1º de dezembro de 1996, por exemplo, no Dia Internacional da Luta contra a Aids, a Legião da Boa Vontade, em sua permanente campanha a favor da Vida e contra o preconceito, reuniu mais de 200 mil pessoas na orla marítima, na Praia de Copacabana, Rio de Janeiro, RJ. A iniciativa teve o apoio de dezenas de personalidades que, com a multidão, bradaram esta máxima de Paiva Netto: "Aids – o vírus do preconceito agride mais que a doença".

____________________________________
* A identidade da entrevistada foi mantida em sigilo para preservar sua imagem.