Quando a ansiedade compromete o seu bem-­estar

Leila Marco

11/01/2016 às 12h50 - segunda-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h04

A quanto anda a sua saúde emocional e mental? Você já parou para fazer essa pergunta a si mesmo? Um sinal de alerta tem sido dado por trabalhos e estudos nacionais e internacionais: vivemos atualmente em uma sociedade urgente, rápida e ansiosa. Dados divulgados pela Pesquisa Mundial sobre Saúde Mental (em inglês, World Health Mental Survey), uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), que reuniu dados epidemiológicos de 24 países, mostra que cerca de 20% dos habitantes da Região Metropolitana de São Paulo*¹ apresentaram algum transtorno de ansiedade.

Vivian R. Ferreira
Dra. Sâmia Simurro

A psicóloga Sâmia Aguiar Brandão Simurro, vice-presidente da Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), explica que, na medida certa, a ansiedade não é uma patologia, ela passa a ser prejudicial quando está excessiva e compromete a vida diária da pessoa. “A Organização Mundial da Saúde define o ‘transtorno de ansiedade’ como um estado elevado de ansiedade no qual a pessoa experimenta sintomas físicos e psíquicos como palpitações, suor, tensão e pensamentos negativos diante de perigos que existem em nossos pensamentos e simulam uma situação de ameaça. Quando esses sintomas não conseguem ser controlados ou minimizados, ou começam a prejudicar a nossa saúde, está na hora de buscar um especialista”.

De acordo com a psicóloga, “às vezes a gente não percebe quando chega esse ‘demais’; alguém precisa dar um toque para que se possa entender isso”.

Os sintomas das crises de ansiedade trazem muito sofrimento ao paciente. “Se não houver nenhuma patologia física, o melhor especialista para se procurar é o psicólogo, ou, eventualmente, dependendo da intensidade, um psiquiatra, para aprender a lidar com suas dificuldades diárias”, ressalta a dra. Sâmia Simurro. Nos casos mais simples, são aconselhadas, em geral, sessões de terapia cognitivo-comportamental (TCC), método que procura modificar padrões de pensamentos e comportamentos associados. Em pacientes mais graves, há uma combinação de remédios e TCC.

Esse processo de reflexão pode ser um grande aliado para novos aprendizados e passa pela interveniência da razão. “No processo terapêutico é assim, tem de ficar no hoje, uma coisa de cada vez. Você precisa ler o jornal interno, saber o seu ponto de equilíbrio, se conhecer bastante, saber os seus limites. Em geral, quando se está ansioso, a pessoa fica pensando que alguma catástrofe iminente vai acontecer; e ter consciência de que 95% das coisas que temos medo não ocorrem, então, a gente sofre, em geral, desnecessariamente”, diz.

O MEDO QUE PARALISA

Um temor inexplicável do futuro, dependendo do grau, prejudica o sono do indivíduo, deixa-o mais predisposto a sofrer de enfermidades cardiovasculares e o impede de fazer coisas comuns à maioria das pessoas. Fobias de diferentes ordens podem instalar-se, como, por exemplo, a síndrome do pânico, muito comum nos dias de hoje. Clara dos Santos*², 54 anos, sabe bem o que é isso. Os primeiros sintomas começaram a aparecer ainda na infância. Ela comenta que já era um pouco agitada, ansiosa, preocupada com as coisas. “Lembro-me de uma vez que minha irmã fez um vestido para mim, eu era menina, e pediu que experimentasse. Vesti e ele ficou muito apertado, não conseguia tirá-lo, a minha irmã teve de rasgar o vestido, porque fiquei muito nervosa, parecia que a roupa ia me sufocar”.

Com o tempo e uma sucessão de acontecimentos, como a perda dos pais (bem próximo um do outro) e a ameaça de desemprego, os sintomas foram ampliados. “Você acha que não tem luz no fim do túnel, acumula tudo, não se abre, não conversa com ninguém e fica guardando para você, e é como uma panela de pressão: chega uma hora que explode”.

Depois desses episódios, os sinais ficaram mais evidentes, e, graças ao apoio de familiares e amigos, Clara percebeu que precisava de ajuda especializada. Ela havia desenvolvido a síndrome do pânico. “Tinha medo em ambientes fechados, em elevador, em avião, em meio à multidão. Sentia um grande desconforto, um aperto no peito, falta de ar. Tinha a sensação de que ia morrer”, conta.

Atualmente, ela convive melhor com esses sentimentos. Fez três anos de terapia, tomou medicamentos, aprendeu a controlar a respiração com exercícios de ioga e adotou pensamentos mais positivos. “Já consigo andar de elevador, viajei de avião. Quando estou nesses lugares e vem essa sensação de medo, procuro respirar fundo, ficar tranquila, calma e pensar que não vou ficar ali presa, que há saída dali. A Espiritualidade, conhecer o meu eu interior e, acima de tudo, o amparo de Deus foram também muito importantes para mim. Li bons livros, a exemplo de Reflexões da Alma, do escritor Paiva Netto, que me deu um conforto muito grande, um bem-estar, uma sensação de saúde, de cura mesmo”, completa.

O MAL DO SÉCULO

Divulgação
Augusto Cury

O alerta vem do psiquiatra e psicoterapeuta Augusto Cury, autor da obra Ansiedade — Como vencer o mal do século. No trabalho, ele apresenta a Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA), segundo ele, um dos problemas mais comuns da atualidade, que atinge, em níveis diferentes, mais de 80% dos indivíduos em todas as idades. “Sem perceber, a sociedade moderna — consumista, rápida e estressante — alterou algo que deveria ser inviolável, o ritmo de construção de pensamentos, gerando consequências seriíssimas para a saúde emocional, o prazer de viver, o desenvolvimento da inteligência, a criatividade e a sustentabilidade das relações sociais. Adoe-cemos coletivamente”, explica o escritor.

O autor argumenta que no passado o número de informações dobrava a cada dois ou três séculos; hoje, isso ocorre a cada ano. Para ele, “(...) mesmo se o conteúdo for positivo, culto, interessante, o aceleramento do pensamento por si só gera um desgaste cerebral intenso, produzindo a mais importante ansiedade dos tempos modernos, com a mais rica sintomatologia”.

Cury expõe que mesmo crianças e adolescentes já sentem os efeitos dessa síndrome, conforme pôde perceber em suas palestras em escolas, onde os alunos, ao serem indagados sobre os sintomas da SPA, afirmavam, em sua maioria, sentir dores de cabeça e musculares. “Foi surpreendente. Quase todos também acenaram positivamente quando perguntei se acordavam cansados, se se sentiam irritadiços e intolerantes a contrariedades, se sofriam por antecipação, se tinham déficit de concentração e de memória.”

A fim de fugir de uma das características mais marcantes da síndrome, a angústia por fatos e circunstâncias que ainda não aconteceram, o livro dispõe-se a ensinar a pensar com consciência, a gerenciar seus pensamentos, a pensar antes de reagir, a ser resiliente. “O maior inimigo não está fora, mas dentro de você”, diz o autor.

De acordo com Augusto Cury, a SPA tem levado ao paradoxo de termos, apesar de atualmente uma vida mais longa biologicamente, a impressão de que o tempo passa mais rápido. São tantas atividades mentais e profissionais que não há espaço para desfrutar, digerir e assimilar experiên-cias existenciais. “Estamos na era do fast-food emocional; engolimos nosso nutriente. Não sabemos amar, dialogar, ouvir, sonhar, interiorizar, jogar conversa fora”, afirma, na obra, o escritor.

Felipe Tonin
Felipe Tonin

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*¹ Os dados do relatório internacional restringiram-se à Grande São Paulo e foram gerados por meio da pesquisa São Paulo Megacity Mental Health Survey. Em âmbito global, o estudo foi coordenado por Ronald Kessler, da Universidade Harvard (Estados Unidos).
*² Nome fictício, para preservar a identidade do paciente.