ESPECIAL COP21 — Extremos climáticos e crise hídrica

Da redação

23/11/2015 às 14h39 - segunda-feira | Atualizado em 22/09/2016 às 16h05

Vivian R. Ferreira
 


Para falar das expectativas que envolvem a 21ª Conferência das Partes (COP 21)*, que se realizará em dezembro de 2015, em Paris, na França, a revista BOA VONTADE entrevistou especialistas de vários segmentos da sociedade sobre os mais destacados temas do encontro e as graves consequências das transformações climáticas no dia a dia das pessoas em todo o mundo, facilmente percebidas em razão da maior ocorrência de fenômenos naturais extremos, entre estes cheias e secas, e de enfermidades favorecidas por essas transformações. 

Confira nesta reportagem a opinião do climatologista, meteorologista e chefe da Divisão de Pesquisas do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden)**, José Antonio Marengo, sobre os extremos climáticos e a crise hídrica.
 

BOA VONTADE — As mudanças climáticas serão um dos grandes temas da COP 21. Como a população as percebe?

José Marengo — Estamos no inverno, mas, nos últimos meses, há recordes de temperatura alta. Segundo a Nasa [agência espacial americana], a primeira metade de 2015 foi a mais quente dos últimos cinquenta anos. É perceptível que os invernos estão mais quentes, e estamos nos adaptando sem perceber. (...) Precisamos trabalhar para que o aquecimento global não ultrapasse os 2 graus, para que os impactos sejam os menores possíveis: o degelo das calotas polares, que pode elevar o nível do mar e afetar as áreas costeiras; o impacto na biodiversidade na Amazônia, no cerrado e nos campos; as doenças tropicais, que podem ser mais frequentes; a energia [elétrica], que deve ficar mais cara... A principal causa [desse aquecimento] é o aumento na concentração de gases de efeito estufa, entre eles o dióxido de carbono.

BV — Qual é o papel da Amazônia na crise hídrica?

José Marengo — Temos notas, não pesquisas científicas, de que o desmatamento da Amazônia é a causa da seca no Sudeste, mas isso não é 100%. Seria um indicador de mudança climática se [essa seca] acontecesse todos os verões durante trinta, quarenta anos. A chuva na região da seca (São Paulo e Serra da Cantareira) vem de várias fontes: da Amazônia, das brisas do Oceano Atlântico e das frentes frias. Durante dezembro de 2013 e o verão de 2014, formou-se uma bolha de ar quente sobre toda essa região. Foi como uma parede, um bloqueio. As frentes frias não conseguiram penetrar [essa barreira] e foram para o Sul. O mesmo ocorreu com as brisas. A umidade que vinha da Amazônia também não chegou ao Sudeste.

“Segundo a Nasa, a primeira metade de 2015 foi a mais quente dos últimos cinquenta anos. É perceptível que os invernos estão mais quentes, e estamos nos adaptando sem perceber.”

BV — A crise hídrica do Sudeste continuará nos próximos anos?

José Marengo — É difícil fazer uma previsão, porque, normalmente, o Inmet [Instituto Nacional de Meteorologia], com o Cemaden, realiza a previsão sazonal do clima, [analisa] como ele será em três meses. As chuvas nessa região devem começar em outubro. Se isso não ocorrer, teremos uma extensão da seca. A situação pode piorar muito. Estamos esperando a primeira frente fria que consiga decretar o início da estação chuvosa. É cedo para dizer se a seca continuará ou acabará, mas, ainda assim, para encher o [sistema] Cantareira, precisaria de muita chuva, 100% acima do normal. Para recuperá-lo, mesmo que chova normalmente, levará, pelo menos, uns cinco anos.

Está matéria está disponível na revista BOA VONTADE (edição 240). Adquira seu exemplar pelo telefone 0300 10 07 940 ou baixe o aplicativo gratuito da revista para iOS e Android.

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* 21ª Conferência das Partes (COP 21) — É o órgão supremo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), elaborada durante a Conferência de Cúpula das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92, na capital fluminense. Nesse encontro, os países signatários da convenção, que entrou em vigor em 29 de maio de 1994, comprometeram-se a criar uma estratégia global “para proteger o sistema climático para gerações presentes e futuras”, tendo como meta principal estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera em um nível que impeça transformações drásticas do clima no planeta.

** O Cemanden é vinculado à Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisas e Desenvolvimento (Seped), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)